Depois de viver obcecada pelo futuro, Jenifer descobriu o prazer das pequenas coisas – passear na praia, telefonar para os amigos, sufocar antigos rancores, comer bolinhos de chuva, levantar-se depois das dez – enfim, ela entendeu que a vida é feita de pequenos momentos que devem ser vividos ao máximo e no presente. Este relato poderia servir de desfecho para qualquer comédia romântica. Mensagens assim aparecem também em músicas, livros e até em discursos religiosos.
Aliás, este tema acompanha a Literatura ocidental desde os gregos. Os melhores líricos cultivaram o gênero que recebeu o nome de carpe diem (“colha o dia”, expressão de Horácio, poeta latino que inovou o gênero). “[...]O sentido é, pois, apanhar o tempo correto, destacando-o do abstrato tempo da vida.” (Francisco Achbar, “Lírica e Lugar-comum – alguns temas de Horácio e sua presença em Português, p. 94). Na prática, o carpe diem é um convite para se aproveitar o dia de hoje, já que não se tem certeza do amanhã, que merece ser ignorado, porque talvez jamais chegue a existir. Não existe, dentro desta visão, limites para se promover o prazer ao máximo (essa busca pelo prazer como um objetivo é chamada de hedonismo). Isto soa familiar?
Mesmo se para alguns o nome “Horácio” não signifique nada além de um dinossauro verde das histórias em quadrinhos, a influência grega ficou. Milhares “colhem o dia” junto com as consequências de um estilo de vida egoísta e irresponsável. Abortos. Embriaguês. Doenças venéreas. Culpa. Depressão. Há saída?
Claro que a Bíblia também trata da brevidade da vida. Salomão nos aconselha a aproveitar nossa curta existência; escrevendo o Eclesiastes, no qual o sábio insiste mais no assunto, ele fala diretamente aos jovens através de um poema (Ec. 11:9-12:8). Este texto se constitui no auge do livro de Eclesiastes e não seria exagero colocá-lo entre os melhores poemas da Literatura Mundial (Horácio teria inveja!).
Na passagem, Salomão nos apresenta a juventude como época de aproveitar a vida – “satisfazer o coração”, “agradar os olhos”, “afastar o desgosto” e “mover a dor da carne”. Ao mesmo tempo, ele nos lembra que a juventude não é eterna, mas será sucedida pelos “maus dias”, forma não muito simpática de se referir à velhice. De forma majestosa, o poeta bíblico usa metáforas para descrever os efeitos do tempo sobre o corpo, em termos que lembram uma tempestade sobre as cidades do oriente médio.
Certo. Mas o que Salomão tem em mente quando se refere a aproveitar a vida? Acontece que a maneira de se aproveitar a vida não está focada no prazer imediato – mas tendo em vista o compromisso de obediência a Deus (Eclesiastes 11:9, 12:1; também na conclusão, 12:13).
Douglas Reis é teólogo
