Cento
e cinquenta anos atrás, decidimos que nos chamaríamos adventistas do
sétimo dia. Na semana anterior a 1 de outubro de 1860, muitas discussões
ocorreram na tentativa de encontrar um nome apropriado para este grupo
de cristãos que compreendiam sua missão como uma resposta as três
mensagens angélicas de Apocalipse 14. Parte dessas mensagens enfatizam
que o povo de Deus, no tempo do fim, chamará toda a humanidade a guardar
os mandamentos de Deus. “Aqui está a perseverança dos santos, os que
guardam os mandamentos de Deus e a fé em Jesus.” (Ap 14:12)*
Pouco depois dessa decisão, em 1860, Ellen White, em suas observações
com respeito à escolha de nosso nome, notou que o nome Adventista do
Sétimo Dia destaca “As feições peculiares e preeminentes de sua fé são a
observância do sétimo dia e a expectativa da volta de Cristo nas nuvens
do céu.”[1]
Aprendi a respeito do sábado, cerca de 34 anos atrás, enquanto
assistia ao programa televisivo Está Escrito, na cidade de Quebec.
Aprendi quando adolescente, ávido por conhecer mais a Bíblia e sua
mensagem. Enquanto assistia ao Georges Herman explicar a Escritura,
minha vida começou a mudar. De todas as novas doutrinas que aprendi, a
do sábado mudou mais a minha vida.
Uma Mensagem Profética
Os primeiros adventistas compreendiam que o quarto mandamento é de
especial interesse no plano de salvação de Deus. Certamente, a mensagem
do primeiro anjo, em Apocalipse 14, cita-o ao anunciar ao mundo que
chegou a hora do juízo de Deus e que a humanidade é chamado a adorar o
Criador que “fez o céu, e a terra, e o mar, e as fontes das águas.” (Ap
14:7)
Desde a criação do mundo, o sábado foi e segue sendo o dia especial
de Deus. No final da semana da criação, Deus deu o sábado a Adão e Eva e
à sua descendência como uma dádiva de descanso e sinal de Sua santidade
(Gn 2:1-3).
Por ocasião do êxodo do Egito, o povo de Deus havia grandemente
esquecido a respeito do sábado. Então Deus lhes deu os Dez Mandamentos.
Deus colocou o mandamento a respeito do sábado no coração da lista para
significar sua importância e papel na vida de lealdade e de obediência.
“Lembra-te do dia de sábado, para o santificar. Seis dias trabalharás
e farás toda a tua obra. Mas o sétimo dia é o sábado do SENHOR, teu
Deus; não farás nenhum trabalho, nem tu, nem o teu filho, nem a tua
filha, nem o teu servo, nem a tua serva, nem o teu animal, nem o
forasteiro das tuas portas para dentro; porque, em seis dias, fez o
SENHOR os céus e a terra, o mar e tudo o que neles há e, ao sétimo dia,
descansou; por isso, o SENHOR abençoou o dia de sábado e o santificou.”
(Êx 20:8-11)
Nos últimos 165 anos os adventistas têm memorizado esse mandamento e
ponderado a respeito de seu significado. Ele nos identifica também mais
do que quaisquer outras crenças. Permanece no centro de nossa identidade
adventista. Acima de tudo, somos adventistas do sétimo dia.
Uma Mensagem Memorial
O mandamento começa com o imperativo: “Lembra-te do dia de sábado, para o santificar”. “Lembrar”. O que devemos lembrar?
O mandamento nos convida a lembrarmos em primeiro lugar que Deus é o
nosso Criador. “Porque, em seis dias, fez o SENHOR os céus e a terra, o
mar e tudo o que neles há e, ao sétimo dia, descansou; por isso, o
SENHOR abençoou o dia de sábado e o santificou.” (Êx 20:11)
Nosso mundo existe porque Deus o criou. O sábado é um memorial da
obra criadora de Deus. Em certo sentido, o sábado responde a uma das
principais questões filosóficas de todos os tempos: “De onde viemos? De
onde veio a humanidade?” O sábado nos lembra que somos filhos de Deus.
No livro de Deuteronômio, quando Moisés repetiu os Dez Mandamentos
aos filhos de Israel, quase no fim de seus 40 anos no deserto, Ele deu
um motivo para guardar o sábado, o fato de que Deus salvou Seu povo da
escravidão do Egito. “porque te lembrarás que foste servo na terra do
Egito e que o SENHOR, teu Deus, te tirou dali com mão poderosa e braço
estendido; pelo que o SENHOR, teu Deus, te ordenou que guardasses o dia
de sábado.” (Dt 5:15)
Nesse contexto, o sábado nos lembra que somos salvos pela graça, pela
iniciativa de Deus, o Deus que é nosso Salvador. Ao descansar no
sábado, demonstramos nossa confiança na salvação de Deus. Longe de ser
um indício de salvação pelas obras, a guarda do sábado é um testemunho
de nossa fé em Deus como nosso Criador e Salvador; a criação e a
salvação são obras do poder e da graça de Deus.
Uma Mensagem Prática
O mandamento do sábado nos convida a nos lembrarmos que o trabalho é
bom. “Seis dias trabalharás e farás toda a tua obra.” (Êx 20:9). Nesse
mandamento Deus diz que há um valor intrínseco no trabalho. O trabalho
foi ordenado por Deus no Éden quando entregou a supervisão da terra
recém-criada a Adão e Eva. Sua responsabilidade era cuidar da terra,
trabalhar no jardim, serem mordomos das dádivas de Deus a eles.
O trabalho faz bem aos seres humanos e o trabalho físico é ainda
melhor. O trabalho fazia parte do plano original de Deus para os seres
humanos. Porém, em nossa sociedade, algumas vezes depreciamos o valor do
trabalho e super enfatizamos o lazer. O mandamento nos lembra de que a
atividade humana é saudável e desejável.
Uma Mensagem de Descanso
Depois, o mandamento nos lembra que embora o trabalho seja bom, e
parte do plano de Deus, o descanso é igualmente importante, o descanso
no sétimo dia, o sábado. “Mas o sétimo dia é o sábado do SENHOR, teu
Deus.” (v. 20)
Deus é nosso exemplo. Depois de trabalhar seis dias, Ele instituiu o
dia de descanso e descansou. O mandamento é claro: a injunção se aplica a
todos os membros da família. “não farás nenhum trabalho, nem tu, nem o
teu filho, nem a tua filha [...].” (v 10) Em outras palavras, o descanso
no sábado é para toda a família. Diferentemente dos demais dias da
semana, o sábado foi separado por Deus para a alegria da família.
Mas, a fim de que não sejamos complacentes, Deus nos lembra que o
descanso no sábado não é apenas para a família imediata. “não farás
nenhum trabalho [...] nem o teu servo, nem a tua serva.” Todos os
empregados por quem somos responsáveis devem também ter esse dia de
descanso.
O mandamento do sábado traz à tona várias questões sociais. Na
verdade, o sábado é um memorial de um resumo social, ou seja, todos os
seres humanos foram criados por Deus, e assim todos os seres humanos:
senhores, servos, pais, mães, filhos e filhas, são iguais aos olhos de
Deus.
O sábado nos lembra de nossa igualdade humana e social diante de
Deus; todos fazemos parte de uma família, a família de Deus.
Independentemente de nosso status social, quer tenhamos propriedade ou a
aluguemos, quer sejamos ricos ou pobres, presidentes da empresa ou
zeladores, todos somos filhos de Deus. No sábado não há classes, status, ou privilégios sociais. Deus ouve as orações e aceita o culto de todos Seus filhos.
No último grupo, Deus nos convida a recordarmos que no sábado: “não
farás nenhum trabalho [...] nem o forasteiro das tuas portas para
dentro.” (v. 10)
O sábado também é para o estrangeiro? O contexto do livro do Êxodo
nos diz que por estrangeiros Deus se referiu aos não convertidos e aos
não israelitas que faziam parte da multidão que havia acompanhado os
hebreus quando saíram do Egito.
Naquela época era fácil para um grupo social dominar o outro, privar
uma comunidade de estrangeiros dos direitos humanos básicos. Mas nesse
mandamento Deus lembra Seu povo que Ele é o Deus de toda a humanidade,
não apenas do povo hebreu.
Jesus também lembrou a Seus discípulos disso quando afirmou: “O
sábado foi estabelecido por causa do homem, e não o homem por causa do
sábado.” (Mc 2:27). No aramaico, a afirmação de Jesus é: “O sábado foi
feito para Adão”, significando todos os seres humanos. Aqui também há um
aspecto social nivelador do sábado. Diante de Deus, todos os seres
humanos são iguais e todos merecem descansar no sétimo dia. O sábado nos
convida a pensarmos naqueles que não pertencem a nosso povo ou à nossa
igreja e que também merecem a bênção do sábado.
Vivemos em uma época quando o medo dos outros se tornou prevalente.
Aqui, nos Estados Unidos, o medo e a ira é direcionada a vários grupos
de imigrantes. O sábado nos ensina a termos cuidado com os sentimentos
para com os que não pertencem à nossa fé. Na verdade, sempre o sábado
foi uma bênção, esperando ser dado aos estrangeiros e forasteiros.
O profeta Isaías anunciou como representante de Deus: “Não fale o
estrangeiro que se houver chegado ao SENHOR, dizendo: O SENHOR, com
efeito, me separará do seu povo; [...] Porque assim diz o SENHOR: [...]
Aos estrangeiros que se chegam ao SENHOR, para o servirem e para amarem o
nome do SENHOR, sendo deste modo servos seus, sim, todos os que guardam
o sábado, não o profanando, e abraçam a minha aliança, também os
levarei ao meu santo monte e os alegrarei na minha Casa de Oração; os
seus holocaustos e os seus sacrifícios serão aceitos no meu altar,
porque a minha casa será chamada Casa de Oração para todos os povos.”
(Is 56:3-7)
Mais que qualquer outro lugar na Bíblia, o mandamento do sábado
destaca a herança comum de todos os seres humanos. Todos somos filhos do
mesmo Criador, todos merecemos as bênçãos que Ele dá no sábado. Aqueles
de nós que ocupam posições de liderança são lembrados a guardarem o
sábado e a convidarem todos em seu círculo de influência a também
receberem suas bênçãos. Por quê? Porque Deus é, para todos nós, Criador e
Redentor.
Mensagem para o Meio Ambiente
O mandamento inclui um lembrete mais. “não farás nenhum trabalho
[...] nem o teu animal” (Êx 20:10). O mesmo mandamento menciona
especificamente, em Deuteronômio, os jumentos e os bois.
Por que Deus lembra Seu povo de deixar os animais descansarem no
sábado? De alguma forma, parece um mandamento estranho. Mas em um mundo
onde a agricultura era a economia principal, faz sentido. Para assegurar
que as pessoas descansem, Deus lhes pede que também permitam aos
animais descansarem. Deus está interessado em todos os aspectos de Sua
criação.
Esse mandamento indica que Deus Se importa com os animais, com Sua
criação e, mais amplamente, com o meio ambiente. Deus nos lembra no
mandamento do sábado que Seu plano original incluía um relacionamento
simbiótico entre os animais e os seres humanos, para que houvesse apoio
harmonioso e cuidado entre todas as partes de Sua criação.
Adão e Eva foram estabelecidos como mordomos da terra; para cuidar
dela, e não destruí-la. No mandamento do sábado Deus conservou a
cláusula da proteção ao animais. Os adventistas que nunca fez parte do
plano de Deus que os animais sofressem nas mãos da humanidade ou que
fossem comidos, no que diz respeito a esse assunto.
Uma Mensagem Toda Abrangente
Em Gênesis 2, no final da semana da criação, Deus fez três coisas no
primeiro sábado. “E, havendo Deus terminado no dia sétimo a sua obra,
que fizera, descansou nesse dia de toda a sua obra que tinha feito. E
abençoou Deus o dia sétimo e o santificou; porque nele descansou de toda
a obra que, como Criador, fizera.” (Gn 2:2, 3)
Deus descansou no sétimo dia; Ele o abençoou e o santificou. Esse é
um dia especial, diferente dos demais. É um período abençoado e santo de
24 horas, a cada semana. Abraham Heschel descreveu-o como um “palácio
no tempo”. Os adventistas insistem que esse dia especial segue abençoado
e santo desde a criação e que, em parte alguma na Bíblia, esse dia foi
mudado por outro, tampouco abolido. O sábado segue como dia abençoado e
santificado, como o foi na criação.
Deus disse a Moisés para lembrar o povo de Israel a respeito do
caráter santo do sábado. “Tu, pois, falarás aos filhos de Israel e lhes
dirás: Certamente, guardareis os meus sábados; pois é sinal entre mim e
vós nas vossas gerações; para que saibais que eu sou o SENHOR, que vos
santifica. Portanto, guardareis o sábado, porque é santo para vós
outros; [...] Entre mim e os filhos de Israel é sinal para sempre;
porque, em seis dias, fez o SENHOR os céus e a terra, e, ao sétimo dia,
descansou, e tomou alento.” (Êx 31:13-17). O sábado foi separado desde a
criação para santificar e identificar o povo de Deus, para separá-los
do mundo.
A observância do sábado por parte de Jesus nos evangelhos (Lucas
4:16) e os milagres que realizou nesse dia (ex.: Lc 4:31-37) também
destacam que ele é especial. Longe de ser um fardo, Jesus mostrou por
Seu exemplo que o sábado é um dia de culto, cura e renovação. Ele
mostrou o sábado como essencialmente um memorial de nossa salvação.
Na verdade, o sábado é tão importante no plano de Deus para os seres
humanos que será guardado como dia especial na nova terra. Isaías nos
diz: “Porque, como os novos céus e a nova terra, que hei de fazer,
estarão diante de mim, diz o SENHOR, assim há de estar a vossa
posteridade e o vosso nome. E será que, de uma Festa da Lua Nova à outra
e de um sábado a outro, virá toda a carne a adorar perante mim, diz o
SENHOR.” (Is 66:22, 23)
Os adventistas do sétimo dia guardam o sábado porque Deus é nosso
Criador, nosso Redentor e porque creem em Sua promessa de uma nova
terra. O sábado é nosso lembrete semanal de Sua obra da criação e
redenção. Nosso nome proclama essa bela mensagem, uma mensagem de
salvação e cura a ser proclamada “aos que se assentam sobre a terra, e a
cada nação, e tribo, e língua, e povo” (Ap 14:6).
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Denis Fortin é diretor e professor de Teologia no
Seminário Teológico Adventista do Sétimo Dia da Andrews University. Este
artigo foi publicado em 28 de abril de 2011.
